quinta-feira, setembro 01, 2005

Genro ou assemelhado

Ontem, depois de um dia inteiro de trabalho, cheguei em casa louco para tirar os sapatos, me atirar na frente da TV e esperar o jantar. Mal botei os pés em casa, Sandra, a minha mulher, veio acabar com as minhas esperanças de um fim de dia reconfortante.
-Oi, Amor, vai tomar um banho. Tu não esqueceu que o namoradinha da Claudinha vem jantar conosco, esqueceu?
-Ah, claro que não!
Subi as escadas pedindo para morrer, claro que não lembrava que o namorado da minha filha iria jantar na minha casa, mas se dissesse isso à Sandra teria que ouvir mais um discurso sobre o meu descaso com os assuntos familiares. Ela sempre me acusa de não dar bola para a nossa família, o que é uma mentira. Me preocupo com ela e com as crianças, mas passo o dia todo na firma com um monte de problemas, quando chego em casa espero paz e não mais abacaxis para serem descascados. Em todo o caso, fui tomar banho para esperar o namorado da Ana Cláudia.
Quando desci, já encontrei o projeto de delinqüente sentado no meu lugar no sofá. Calma, já haviam me recomendado ser educado com o rapaz. Dei boa noite e recebi um “oi, tio” intolerável, mas respirei fundo, a paz familiar merece esforços. Dei uma olhada de cima a baixo no piá; camiseta preta, calça jeans três números maior e um brinco na sobrancelha. Resolvi sentar-me para me recuperar.
Sandra, minha filha e o namoradinho estavam falando sobre o cursinho pré-vestibular, resolvi ser sociável e participar do diálogo. Perguntei para o guri o que ele ia fazer da vida, enquanto ele respondia que estava em dúvida entre bibliotecomonia e ciências aeronáuticas, percebi que ele tinha mais um penduricalho na língua. Perguntei se aquilo não atrapalhava, mas quem respondeu foi a Ana Cláudia, disse que não e mandou eu deixar de ser careta. Depois dessa tentativa, fracassada, de diálogo resolvi calar a boca, pois a Sandra já estava me olhando de lado.
A empregada chegou para avisar que a mesa estava posta, fomos para a sala de jantar. Enquanto os outros comiam, não consegui parar de pensar no brinco na língua do guri, na quantidade de germes que deveriam estar acumuladas naquele buraco na carne e no mal que isso poderia causar à minha filhinha que, pelo jeito, não havia pensado a respeito.
Logo depois do jantar, o cachorro magro foi embora, dizendo que tinha aula cedo. Dei “Graças a Deus”, pois não agüentaria mais muito tempo vendo aquela aberração da natureza do lado da minha menina, chamando-a de Cau. Fui deitar cedo, pois não estava em condições de ouvir a Sandra reclamando da minha mudez durante o jantar e discorrendo sobre o quanto eu sou anti-social. Depois de ontem, passei a considerar a idéia de sugerir a Ana Cláudia dedicar-se à vida religiosa. Se for para ter um genro, Jesus Cristo é o melhor candidato.