quarta-feira, maio 03, 2006

Primavera

Não sei a data, ao certo, era outubro ou novembro. Talvez até fosse setembro. Era quente, não o quente de janeiro, tinha o clima de primavera. Sempre achei que a primavera foi feita para se apaixonar. Hum, era uma terça-feira. Não sei como guardei isso, de ser terça-feira. Estávamos no colégio, eu adorava ficar no colégio sem ter nada para fazer. Minha mãe sempre implicava, mas era tão bom ficar por lá sem nenhum compromisso. Sempre inventava trabalhos em grupo para poder passar as tardes no colégio. Era tão bom aquilo. Ficávamos em algum banco, meio jogados, os pés de uns sobre os de outros, a cabeça em algum ombro de amiga ou de um amigo giz de cera. Sempre prontos a dar uma desculpa esfarrapada para alguém do SOE que aparecesse e perguntasse o porque da nossa presença ali. Não era tarde, mas eu disse que ia embora. Não lembro ao certo porque fiz aquilo, lá se vão muitos anos. Olhei em volta e perguntei quem iria me levar na parada. Tínhamos esta mania, pedíamos companhia para ir pegar o ônibus. Era uma forma de tentar ficar sozinho com alguém. Seja com uma amiga para fazer os comentários da tarde, seja para ver se o menino em questão iria se oferecer para nos fazer companhia. Acho que por isso resolvi ir embora cedo. Talvez se ele não tivesse se oferecido, eu ficasse me enrolando e só fosse embora mais tarde. Mas ele se ofereceu, o menino cor de mel disse que ia comigo. Perguntamos se mais alguém nos acompanhava. Ninguém se manifestou. Não sei se por preguiça ou se o clima entre nós era visível. Bem provável que pelo segundo motivo.

Eu esperava e temia há dias pelo momento que ficássemos sozinhos. Já fazia algum tempo que os olhares e indiretas andavam se intensificando. Na última vez que havíamos ficado sós ele havia sido claro. Quando estávamos chegando na frente do colégio, onde as pessoas podiam nos ver, mas não nos ouvir, ele disse que tinha vontade de ficar comigo. Eu nunca havia ouvido isso tão claramente, muito menos de alguém que eu queria ficar. Aquela frase ecoava na minha mente há dias e eu sabia bem que dá próxima vez que ficássemos a sós o assunto voltaria. Eu esperava ansiosamente por isso. Um misto de vontade e medo.

Caminhávamos lado a lado. Quanto mais nos afastávamos do colégio, mais minhas mãos gelavam, meu estômago gelava, mais eu tremia. Entre a quadra do colégio e o terminal de meu ônibus havia uma praça. Logo que passamos na esquina ele parou. Disse que não queria me levar na parada. Eu o olhei com cara de interrogação. Ele disse que queria fazer outra coisa. Eu disse: então faça. Então seus lábios tocaram os meus. Não sei quantos beijos ele me deu. Sei que esqueci o ônibus, esqueci a parada, esqueci até que eu tinha casa. Passaram-se minutos, horas. Nós em um banco daquela praça. Certamente, era primavera.

4 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Não sei quanta a ele, mas nessas horas eu sempre pensava algo como "bom, to fudido. Agora vou ter que mostrar que sou homem".
Tempos bons aqueles...

3/5/06 14:43  
Anonymous Anônimo said...

Que lindo! Nada como um bom friozinho na barriga para imortalizar uma primavera! hehehe É, a gente nunca esquece esses momentos! Beijos amada

3/5/06 20:24  
Anonymous Anônimo said...

Hunf, ningúem leva a sério o esquema de cores

4/5/06 02:05  
Anonymous Anônimo said...

Eu sou daltônico, logo, me redimo (redimo?!) de ver "essas coisas"...

4/5/06 19:29  

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